Canções. Filmes. Livros. Poemas.
Essas palavras aí em cima, nestes tempos pandêmicos, se tornaram, de certa forma, boias salva-vidas. Agarro-me a elas com frequência, em dias que se sucedem, quase todos muito parecidos, para sobreviver. Ou escapar. Mas do que ando fugindo? Do novo coronavírus ou de mim mesmo? Possivelmente, de ambos.
Jornalista há mais de 30 anos, sou viciado em notícias. Se fico muito tempo alheio ao que acontece, mergulho em agonia profunda, numa espécie de crise de abstinência, como se algo vital estivesse faltando, a escapar-me pelos dedos, me lançando à deriva, como um marinheiro que perdeu as graças do mar.
Quem me cerca, e não é jornalista, fica intrigado, quando não irritado com meu comportamento: “Que necessidade você tem de saber tanta coisa ruim, quantos estão morrendo, qual o último absurdo dito pelo presidente?”. Pois é, escolhi esse ofício, esse vício, há tanto tempo, que minhas respostas são quase sempre retóricas e não dão conta da camada mais profunda, existencial dessa dependência. Estar bem informado não é (apenas) uma opção, ou uma obrigação, mas uma necessidade. Mas entendo: é, também, um tipo de masoquismo, sobretudo neste momento em que viver dói.
Por isso mesmo que recorro às artes. Para me manter vivo, alimentado, inspirado e incitado, até porque a cultura muitas vezes não possibilita ou permite a fuga. Nem acaricia. Muito pelo contrário. Canções, filmes, livros, poemas, a arte, podem nos confrontar, nos colocar contra a parede. Fazer o quê? Eu gosto, e preciso dessas experiências. Pago por esse ultraje, porque dele preciso.
Por isso mesmo que recorro às artes. Para me manter vivo, alimentado, inspirado e incitado, até porque a cultura muitas vezes não possibilita ou permite a fuga. Nem acaricia. Muito pelo contrário. Canções, filmes, livros, poemas, a arte, podem nos confrontar, nos colocar contra a parede.
Há mais de um ano – isso mesmo, quase 400 dias -, fomos atropelados por essa faca na garganta chamada pandemia. Essa sensação de ameaça que vai e vem, sorrateira, a nos alterar os sentidos, e o cotidiano, nos forçando a olhar a vida de outra forma. A um metro e meio de distância, na melhor das situações, através da janela, longe. Há amigos queridos que vivem na mesma cidade e eu não vejo há mais de 400 dias. É justo, é humano? Não saberia mais dizer.
Por isso, recorro à arte. Para não deixar de ser humano, sobreviver. Resistir para existir.