Eu confesso que não sei de onde surgiu esse costume corporativo de tratar os colegas pelo sobrenome. Talvez um resquício de séculos passados, talvez uma tentativa de abrir a fórceps o caminho para a formalidade — justo aqui, nesta terra que profissionalizou a camaradagem. Temos então o Paiva, o Teixeira, o Pereira, o Carvalho, o Bernadelli, o Lima, o Garrido e o Lopes, a se tratarem da maneira mais fria que conseguem imaginar, mesmo que se xinguem e se zoem durante o expediente ou happy hour.
Nunca, entretanto, senti firmeza quando via os colegas do meu pai chamando ele de Alhanati. Você é filho do Alhanati? Parecia uma troça aos meus ouvidos, e a graça estava na sonoridade do nome. Não apenas soava feio como sabia, desde um primeiro momento da infância, que não era assim, como se lê, que se pronunciava a bandeira da família. Aurranáti, fazíamos o agá aspirado que corrigia parte da comicidade do sobrenome e fazia justiça à comédia involuntária de nosso exótico apodo.
Não se sabe muito bem sobre a história dos Alhanati. Sabe-se, com uma breve pesquisa no Forebears, que existem pouco mais de 500 indivíduos no planeta que atendem pelo nome, a maior parte deles se encontra na Palestina. Alguma predominância na França, Estados Unidos, Turquia e Brasil. No Paraná, o Forebears diz, reside apenas um Alhanati. Eu. De modo que trata-se de uma só grande família espalhada pelo mundo. O bisavô, Silvano Solomon Alhanati, judeu poliglota que veio da Grécia para o Rio de Janeiro na década de 1920, fez de tudo um pouco. Entre o ofício de mascate e vendedor de tapetes, destacou-se no corte e lapidação de pedras, tendo grandes nomes da diplomacia entre seus principais clientes. Desenhava e coloria os projetos como ninguém, e dele hoje adviram os quase cem Alhanatis que moram no Brasil. Não soube, entretanto, transmitir a pronúncia do nome corretamente a um país que prevê justamente o dígrafo da confusão. Na tentativa de corrigir isso, individualizei-me com um apóstrofo que a era digital de cartões de crédito e passagens de avião online não entendem. Desculpe, o nome e sobrenome não pode conter números e caracteres especiais, pelo menos enquanto Elon Musk não processar a Internet inteira em busca da inclusão digital de sua filha de nome impronunciável.
Não se sabe muito bem sobre a história dos Alhanati. Sabe-se, com uma breve pesquisa no Forebears, que existem pouco mais de 500 indivíduos no planeta que atendem pelo nome, a maior parte deles se encontra na Palestina. Alguma predominância na França, Estados Unidos, Turquia e Brasil. No Paraná, o Forebears diz, reside apenas um Alhanati. Eu.
Resta a assinatura desta coluna, o copyright dos meus livros, os créditos das entrevistas que dou e não muito mais do que isso. Alguém disse que era nome artístico, mas eu não sei. Acho muito pouco artístico para ser um nome social, como Carlos que vira Karl ou Suplicy que vira Supla. Honestamente, não considero mais do que um guia pedagógico por um sobrenome que exige a soletração, mesmo quando falado de forma pausada e com o respeito ao dígrafo.
De onde vem esse nome? É italiano? É russo? Porque Yuri é russo, né? Ou é japonês, porque Yuri é japonês, correto? Tive um cachorro chamado Yuri uma vez, ele não era que nem você, diz a pessoa que me vê respirando aliviado diante da impossibilidade de ser irmão gêmeo separado no nascimento do cachorro de alguém. É grego, digo, embora tenha predominância em território árabe e uma associação obscura com o povo judeu. Digo e vejo que nada se resolve. Yuri abana o rabo, alienado do fato de que seu nome era pra ser de gente. E você já teve um cachorro chamado Al’Hanati?