Escrever uma coluna focada em apresentar novos sons tem seus prazeres e seus desafios. Falando especificamente deste último, nada como ser confrontado com um grupo que faz você refletir sobre a produção musical nacional.
Pós ano 2000, vivemos uma fase no rock nacional que categorizo em três partes: pastiche, grandes grupos e o time do meio, ainda em busca de identidade própria frente a tantas referências. O grupo manauara Luneta Mágica se encaixa justamente neste último grupo.
Com dois discos lançados – Amanhã vai ser o Melhor Dia da sua Vida (2013) e No Meu Peito (2015) -, o grupo de Pablo Araújo, Erick Omena, Eron Oliveira e Daniel Freira perambula no limite entre o exagero nas referências e a originalidade.
Após um primeiro disco em que a Luneta Mágica soava um mix de referências oitentistas, desde o synthpop até o rock alternativo do The Jesus and Mary Chain, No Meu Peito veio com uma sonoridade diferente, mais próxima do que o indie rock tem produzido no Brasil nos últimos 15 anos.
É bom deixar claro que não há demérito algum nisso. O quarteto de Manaus é afiadíssimo, excelentes representantes de uma nova safra que tem feito a cena manauara ganhar corpo e prestígio, tanto local quanto nacionalmente.
“Astronauta”, faixa que abre o disco de estreia da Luneta Mágica, é uma das mais doces e belas demonstrações de como o grupo escocês, que completou 30 anos de Psychocandy semanas atrás, ainda é relevante. “Não Acredito” também possui aquela energia do pós-punk juntamente a urgência da indietronica. E assim, repleto de variações na sonoridade, Amanhã vai ser o Melhor Dia da sua Vida torna-se um disco confuso como conjunto, mas isoladamente muito bom.
Na contramão, No Meu Peito, disco lançado em março deste 2015, é muito mais coeso. O grupo se fixa mais no indie rock e faz de suas referências camadas interessantes nas canções, deixando claro uma unidade e homogeneidade entre elas.
O disco abre com a lindíssima faixa homônima “No Meu Peito”, um mergulho singelo no Clube da Esquina. “Lulu” e “Acima das Nuvens” dão uma agitada no disco, que torna a cadenciar em “Mônica”.
O equilíbrio neste trabalho tornou o som da Luneta Mágica mais especial, já que, apesar de caminhar por vertentes repletas de outros grupos, não tropeçaram em fazer um rock mimético.
O grupo se fixa mais no indie rock e faz de suas referências camadas interessantes nas canções, deixando claro uma unidade e homogeneidade entre elas.
As letras também estão mais maduras. Mesmo as canções mais dançantes, como “Só Depois”, que apesar da batida eletrônica (que mereceria um lindo remix nas casas alternativas do país), é uma música com uma poesia mais introspectiva.
A virada na metade da faixa, passeando pelas experimentações a la Arnaldo Antunes, parecem reforçar esse esforço da Luneta Mágica em ser original a partir de tudo que amam, inclusivem o fato de serem músicos.
“Mantra” e sua entrada David Bowie encontra Belchior são, definitivamente, o ponto alto de No Meu Peito. Por sorte, o quarteto não perde o pique na quatro últimas faixas, mesclando euforia e recolhimento até fechar com a psicodélica “Rita”.
Fica a torcida para que este disco seja a afirmação de um eixo na carreira da banda. Fica a torcida, ainda, para que atravessem os quilômetros que nos separam e façam um show imediatamente no Sul do país. Não custa torcer, não é?
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