Uma crítica traz naturalmente outras palavras a uma produção, um olhar diferente que acaba se detendo em questões que talvez nem fossem questões no calor da criação. Então vamos falar dessa Outra palavra, que considero [highlight color=”yellow”]um espetáculo marcante na cena de Curitiba 2017[/highlight].
Primeiro, por ter sido criado sem incentivos nem patrocínio (o que é anunciado antes do início); segundo, por ter sido tão bem criado, nutrido, [tie_tooltip text=”Alimentado, nutrido.” gravity=”n”]apascentado[/tie_tooltip] por um grupo grande de pessoas, com um resultado que é um bálsamo.
Apesar de tratar, ou melhor, abarcar, entre outros, temas tensos no mundo hoje, como a migração, paira sobre o todo uma certa leveza. Uma doçura que vem do texto (Francisco Mallmann) e do balé da teatralidade, na direção de Maíra Lour.
As cenas intercalam cinco histórias inspiradas nas palavras fronteira, identidade, território, lugar e corpo. Seguem-se costuradas umas às outras num trabalho de diretor-artesão-trabalhador braçal, que emenda entradas em saídas e cenários em outros cenários com maestria.
Um morto de Pernambuco; uma filha adotiva; uma estrangeira parente; uma célula insurgente.
Apesar de tratar, ou melhor, abarcar, entre outros, temas tensos no mundo hoje, como a migração, paira sobre o todo uma certa leveza.
Nos relacionamos talvez mais com o grande concerto corporal, de cores, plantas, sofás, do que com a interioridade dos seres ficcionais evocados. Nos agarramos mais a esses termos-conceitos que perpassam cada cena, cada trecho dos contos teatrais executados, num balé em que cabem a dança das cadeiras da competição, a busca por raízes, a misericórdia por um desconhecido.
[highlight color=”yellow”]A encenação nos embala, mas coloca pontos de contato, talvez confronto, como o olhar dos atores no início[/highlight]: deixando-se ver pela plateia, impedindo que se erga uma quarta parede e prometendo um pouco de agressividade.
Ela vem em ruídos sutis. A sujeira que cai no palco logo no começo e que não cabe debaixo do tapete. Fica ali, uma areia na engrenagem, numa forma de arranhar a lembrança e mostrar-se. Ou, talvez, formando um tapete de sujeira sobre o qual vivemos e do qual ninguém nem lembra mais, “sempre foi assim”.
Terra – do pertencimento geográfico ou biológico – é esparramada também, sujando mais um pouco, mas com moderação. A trilha acrescenta ruídos sonoros e musicais ao embalo em que vamos ao longo do espetáculo.
[highlight color=”yellow”]São muitas as outras palavras a que se alude[/highlight]. Elas podem estar em outro idioma, em outra versão dos fatos, em uma atitude que rompe com a tradição. Por exemplo, oferecer um espetáculo de grande qualidade em tempos de crise.
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FICHA TÉCNICA | Outra Palavra
Direção: Maíra Lour
Dramaturgia: Francisco Mallmann
Elenco: Álvaro Antonio, Cleydson Nascimento, Helena de Jorge Portela e Janaina Matter
Direção de Produção: Michele Menezes
Cenário: Pablito Kucarz
Pesquisa em cenário e direção de arte: Marja Calafange
Cenotécnico: Felipe Casagrande
Figurinos: Fabianna Pescara e Renata Skrobot
Luz: Beto Bruel e Lucas Amado
Operação de luz: Erica Mithiko
Sonolastia: Álvaro Antonio
Assistente de palco: Joana Walter
Produção executiva: Gabriela Berbert
Interlocução artística: Lucienne Guedes e Adriano Basegio
Preparação vocal: Silvana Stein
Áudios: Ailén Scandurra, Azul Masseilot, Lovena Ariste e Oula Alnakola
Traduções: Gandi Takanori Shirasawa e Helen Kaliski
Fotos: Olívia D’Agnoluzzo
Vídeos: WTF?!filmes
Designer gráfico: Pablito Kucarz
Comunicação: Ana Cristina Bostelmam e Marcos Romualdo dos Santos[/box]