Poderia afirmar que um dos primeiros destaques notados em Diários de Andy Warhol, minissérie em seis capítulos lançada em março pela Netflix, é a voz do gênio da pop art narrando, no século XXI, suas próprias intimidades. Mas são seus segredos a parte mais enternecedora.
Seria redundante querer tratar algo sobre a carreira de um homem cujas obras falam por si, e que uma simples busca em livros de história da arte ou em websites na internet traria todas as informações necessárias. Por essa razão, a minissérie é ainda mais interessante.
Com produção executiva de Ryan Murphy (American Horror Story) e dirigido por Andrew Rossi, a produção parte do livro homônimo (L± tradução de Celso Loureiro Chaves, 544 págs. – clique aqui para adquirir o livro), de 1989, um calhamaço que o artista ditou para a amiga Pat Hackett, por telefone, a cada manhã, contando o que se passava em sua vida e na sua mente, isso ao longo de 19 longos anos.
Na série, assim como no livro, Andy Warhol deixa a língua solta, comentando todos os pormenores de sua vida, fofocas sobre sua relação com amigos, jornalistas e celebridades, havendo espaço, até mesmo, para comentários maldosos sobre outros artistas. Desnuda-se, ao longo dos episódios, suas mais profundas angústias, assim como seus temores.
Andy Warhol sofreu das penas do amor demais
Parte do que vemos em Diários de Andy Warhol diz muito sobre os sentimentos do gênio, não apenas sobre sua relação familiar ou com outros artistas, mas de suas paixões. Há o peso do surgimento da Aids, mas, anterior a isso, Andy não esconde que sofre por amor, uma dor motivada tanto pelo preconceito, quanto pela rejeição de quem amou.
Parte do que vemos em Diários de Andy Warhol diz muito sobre os sentimentos do gênio, não apenas sobre sua relação familiar ou com outros artistas, mas de suas paixões.
Jon Gould, por exemplo, tinha uma relação atribulada com Warhol. Foi um de seus maiores amores, mas parecia o rejeitar, especialmente por receio de perder o cargo de executivo na Paramount. Jon entra na vida de Andy após o romance do artista com Jed Johnson. Nas páginas de seu diário, o Warhol designa a ambos um papel importante, como se lhe tivessem dado uma espécie de energético vital. Mas, para Gould, há também espaço à mágoas.
Mas a relação mais impactante ao longo das páginas é a que ele estabelece com o também artista Jean-Michel Basquiat, um ex-grafiteiro a quem Warhol adota numa relação de mentor/mentorado. É um romance platônico, para o qual a arte parece ser a pergunta e a resposta. No caso de Andy, é seu último grande período de produções antes da morte, para Basquiat é o ápice de uma vida breve, terminada em uma overdose aos 27 anos.
Warhol & Basquiat: a gênese e o fim de uma relação de codependência
Poucas relações na arte contemporânea foram tão frutíferas quanto a de Warhol e Basquiat. Jean-Michel era um amor platônico de Andy, a quem queria ver bem e por quem o amor foi mecanismo de aproximação artística.
As colaborações entre os dois eram desenvolvidas em um cenário de codependência: a paixão, para Warhol, a experiência, para Basquiat. Se não chega a ocupar um espaço como de Jon Gould na vida do gênio maior da pop art, o ex-grafiteiro é fundamental ao último sopro de genialidade de Andy Warhol.
Como em tudo na vida do artista, nascido em 1928 na cidade de Pittsburgh como Andrew Warhola, o drama se espalha na relação dos dois, os afastando do trabalho colaborativo. A proximidade ao mesmo tempo distante que mantêm até a morte de Warhol é o capítulo mais triste de Diários de Andy Warhol.
Inteligência Artificial e ator Bill Irwin “deram vida” a Andy Warhol
Uma das primeiras reações ao assistir a minissérie é ser surpreendido pela voz do próprio Andy lendo as linhas transcritas por Pat Hackett, como se compartilhasse de vontade própria seus segredos com o público.
Obviamente, não se trata de Andy Warhol, mas do bom uso da tecnologia em favor da arte – ainda que discussões importantes possam ser levantadas a partir disso. A equipe de produção de Diários de Andy Warhol utilizou uma inteligência artificial, que analisou a voz do artista para recriá-la.
Em virtude da pouca quantidade de gravações da voz do artista, o ator Bill Irwin (Law & Order: SVU) foi convidado a emprestar sua voz para o seriado. Ao todo, aproximadamente 20% do que ouvimos no programa é produto do trabalho de Irwin, restando à IA o restante da operação.
A opção de trabalhar com uma inteligência artificial passou pela autorização da Fundação Andy Warhol. De acordo com informação do Decider, o software utilizado para a composição da trilha de voz era tão sofisticado que “permitiu ao diretor da série adicionar emoção às palavras emitidas pela IA[1]”.
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[1]Decider
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