Histórias de amor são, desde sempre, pratos cheios para a dramaturgia. Acrescente pitadas dramáticas e você terá algo muito próximo de um sucesso comercial.
Mas, e quando tudo isso parte de um acontecimento real, seria a ficção capaz de se conectar com a realidade de modo coerente? Recomeço, minissérie original da Netflix, talvez seja um bom ponto de partida para essa discussão.
Adaptada do livro homônimo de memórias da atriz e ativista Tembi Locke, a produção narra a história de amor de Amy e Lino, um casal que se apaixona, mas precisa enfrentar os percalços da vida para celebrar esse amor.
No livro, a autora compartilha com leitores seu passado com o primeiro marido, o siciliano Saro, chef de cozinha que a atriz conheceu em Florença e por quem desenvolveu uma forte paixão.
Acontece que a família super tradicional de seu amado não aceitou o casamento com uma mulher negra, norte-americana e atriz. No entanto, o amor da dupla foi muito maior que a rejeição familiar. Logo, foram viver em Los Angeles, onde adotaram um bebê e viveram felizes, até que um câncer interrompesse a trajetória do casal.
Tembi Locke também chefiou a adaptação de Recomeço para a Netflix, que é bastante fiel nos detalhes, ainda que opte por modificar os nomes e alguns aspectos importantes.
https://www.youtube.com/watch?v=_FgzqoDnM8Q
É inegável como Recomeço consegue prender o espectador com a força desse romance.
Na minissérie, Tembi é Amy (Zoe Saldaña) e Saro é Lino (Eugenio Mastrandrea). Amy abandona a carreira e parte em uma viagem paga pelo pai para a Itália, em busca de inspiração (e coragem) para seguir seu sonho de ser uma pintora. Lá, apesar de um breve flerte com um italiano rico e com conexões no mundo das artes, é por Lino que Amy se apaixona.
A sinergia entre eles é imediata, mas um problema a curto prazo ameaça a relação: a garota necessitará voltar aos Estados Unidos, e um oceano surgirá entre eles.
Porém, o amor de Lino é tão grande que ele decide abandonar seu trabalho e se mudar para Los Angeles com Amy. As consequências dessa mudança vão conduzir o caminho tortuoso (e agridoce) do casal. Esse é o ponto que mais causa incômodo no melodrama.
Para dar ênfase à força do amor entre Amy e Lino, o roteiro vai levar a relação deles a extremos seguidamente: a não aceitação do relacionamento por parte da família de Lino, as dificuldades do italiano para se encontrar profissionalmente nos Estados Unidos, as rusgas de viverem de favor na casa da irmã de Amy, o desejo da garota de ter uma carreira como artista em contraponto aos anseios pessoais de seu par, e tudo culminando com um câncer agressivo, que atinge a saúde de Lino.
É inegável como Recomeço consegue prender o espectador com a força desse romance, que não vive apenas nas entrelinhas ou nos discursos, mas nas atitudes de seus personagens. Mas, para pensar no próprio título da minissérie, são excessivos recomeços, conflitos e obstáculos, que podem até fazer sentido dentro de um contexto amoroso, mas que cansam na TV.
Não facilita a vida, também, os episódios longuíssimos, de cerca de 55 minutos cada. A duração age menos em favor do conteúdo e mais de oferecer em sacrifício a excruciante jornada para que estejam juntos. É bonito, mas ainda mais exaustivo.
De todo modo, Recomeço é uma interessante escolha para quem precisa se reconectar com as infinitas possibilidades do amor, mesmo que estereotipadas aqui e acolá. E após um processo eleitoral tão carregado de ódio, acreditar no amor é um remédio (e um recomeço) e tanto.
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