Um retrocesso épico no cinema de ação. Não há como utilizar meias palavras para descrever Agente Oculto, superprodução assinada pelos irmãos Anthony e Joe Russo, diretores de grandes sucessos do MCU (Universo Marvel), como Capitão América – O Soldado Invernal e Vingadores: Ultimato. O filme foi lançado pela Netflix no fim do mês de julho, como estratégia para atrair novos assinantes e já tem uma continuação confirmada.
Com um orçamento de US$ 200 milhões – R$ 1 bilhão –, recorde para a plataforma de streaming, Agente Oculto é um vistoso show pirotécnico, com explosões de prédios inteiros, perseguições de carros espetaculosas, fumaça colorida, muito tiro, porrada e correria em várias cidades do mundo. Isso sem falar de um elenco estelar, liderado por Ryan Gosling, como o personagem título, assassino que se torna uma espécie de agente letal da CIA, e seu antagonista, Chris Evans, o Capitão América, que busca se descolar do super-herói que o tornou famoso, vivendo um sujeito asqueroso, com um bigodinho calhorda.
Falta a Agente Oculto, sobretudo, um bom roteiro, no qual as infindáveis sequências de ação façam algum sentido dramático e não sejam mero exercício de exibicionismo, sem maior conexão com a trama ou com a jornada dos personagens. São picotadas, como em um videoclipe antigo, e pouco orgânicas.
O personagem de Gosling, Six, no prólogo do filme, está em uma prisão, cumprindo pena por homicídio, quando recebe de Donald Fitzroy (Billy Bob Thorton, de A Última Ceia) uma proposta indecente – e irrecusável. Em troca de sua liberdade, tornar-se mercenário da CIA, fazendo o chamado “serviço sujo”: atuar como matador de aluguel por tempo indeterminado, sem que ninguém saiba a sua real identidade.
Anos mais tarde, Six embarca em uma missão pela Europa para resgatar Fitzroy, e sua família, de Lloyd Hansen (Chris Evans), ex-oficial da CIA que agora atua junto a uma gigantesca organização francesa. É quando o protagonista acaba descobrindo segredos bastante cabeludos da agência, o que coloca Loyd sem seu encalço, pois o mercenário pode pôr em risco todo um esquema internacional bilionário, que envolve negócios petrolíferos na Nigéria.
Nesse jogo de gato e rato, há lugar até para o ator brasileiro Wagner Moura, que vive com desenvoltura o papel de Lazlo Sosa, um ardiloso falsário em Praga, onde acontece uma das sequências de ação mais absurdas do longa, envolvendo um bonde descarrilado.
Bourne
É inevitável, ao assistir a Agente Oculto pensar nos filmes da franquia iniciada em 2002 por A Identidade Bourne e protagonizada pelo agente “sem memória” Jason Bourne, vivido por Matt Damon. Sobretudo no terceiro e terceiros filmes da trilogia, A Supremacia Bourne (2004) e Ultimato Bourne (2007), dirigidos pelo ótimo cineasta britânico Paul Greengrass, nenhuma cena ou sequência de ação, por mais espetacular que sejam – e elas são – está dissociada do enredo. Todas têm função dramática e fazem a trama avançar. Mais do que isso: elas são coerentes com o arco dramático percorrido pelo protagonista, ao mesmo tempo heroico e trágico, multidimensional.
É inevitável, ao assistir a Agente Oculto pensar nos filmes da franquia iniciada em 2002 por A Identidade Bourne e protagonizada pelo agente “sem memória” Jason Bourne, vivido por Matt Damon.
O impacto de Bourne é visível nos filmes de outras franquias de ação que envolvem agentes secretos, como a veterano do espião 007, que na pele de Daniel Craig ressurgiu mais humano e vulnerável, e Missão Impossível, estrelada por Tom Cruise, cujo personagem, Ethan Hunt, tornou-se mais complexo e menos unidimensional a cada episódio.
Agente Oculto dá vários passos atrás em comparação a esses exemplos. Embora Ryan Gosling seja um ótimo ator, versátil, Six é um personagem construído sem muito cuidado, pífio mesmo. Mal sabemos quem ele é, a despeito de pistas polvilhadas forçadamente ao longo da narrativa, que, além de confusa, é muito rasa.
As sequências de ação, especialidade dos irmãos Russo, são muito bem realizadas do ponto de vista técnico, sem dúvida mas não emocionam, porque parecem estar ali apenas para deixar claro para o público que estamos diante de uma superprodução e não de um bom filme. Se, de fato houver uma sequência de Agente Oculto, que ao menos seja com um roteiro melhor.
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