É bela (e competente) a construção do roteiro de Pequena Miss Sunshine (2006). Logo no início, cada um dos seis personagens principais que compõem uma família muito particular é rapidamente apresentado, individualmente, em situações do seu cotidiano. Na sequência, todos reúnem-se para um jantar com destaque para o frango frito e o refrigerante de limão. É a oportunidade que o roteiro de Michael Arndt lança para o espectador de conhecer detalhes sobre cada um dos personagens e sobre quão complexa, engraçada e tensa é a relação entre eles.
A partir do microcosmo dessa família, Pequena Miss Sunshine faz uma representação do macrocosmo que é a própria humanidade, com suas relações sociais nada dicotômicas, preto no branco, mas cinza em mais de cinquenta tons, com seus muitos indivíduos com características especiais. Mais especificamente, o filme é um poderoso questionamento a respeito das ideias de sucesso e fracasso, bem como uma alfinetada nos padrões de beleza impostos desde a infância.
Neste 2021, a produção dirigida por Jonathan Dayton e Valerie Faris completa 15 anos de estreia nos cinemas. De lá para cá, ele permanece com sua mensagem atualíssima. Atemporal. E assim tende a permanecer. Olive (Abigail Breslin) é uma garotinha encantada com a ideia de vencer o concurso de beleza que dá título ao filme, apesar de não se encaixar perfeitamente nos padrões que essas competições exigem. Frank (Steve Carell), tio de Oliver, é um professor universitário gay, estudioso de Marcel Proust, que, em razão de uma desilusão amorosa, tenta o suicídio.
Dwayne (Paul Dano), irmão de Olive e fã de Friedrich Nietzsche, faz um voto de silêncio até conquistar sua meta de tornar-se piloto da Força Aérea. Sheryl (Toni Collette), a mãe de Olive, é uma espécie de porto seguro e diplomata da família, mesmo estando prestes a divorciar-se do marido. Richard (Greg Kinnear), o pai, é autor de um programa de autoajuda e motivação. Apesar de ser um projeto para fazer com que todo mundo seja bem-sucedido, o próprio Richard é um fracassado na implantação do seu plano, seja em sua vida particular, seja na comercialização do programa.
Quando a câmera aproxima-se da lateral da Kombi e o movimento do veículo vai mostrando os personagens acomodados nos bancos, de dois em dois, tem início, enfim, o road movie
Alan Arkin, em um papel que lhe rendeu o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante em 2007, interpreta o avô de Olive expulso de uma casa de repouso por usar heroína. Ele é o diretor dos ensaios da neta para o concurso de beleza. Para que Oliver possa participar da apresentação, os seis integrantes da família partem em viagem em uma velha Kombi amarela (cujo problema com a buzina promove uma cena muito hilária, além de ela própria, a Kombi, ser uma metáfora da vida de cada um dos personagens).
Quando a câmera aproxima-se da lateral da Kombi e o movimento do veículo vai mostrando os personagens acomodados nos bancos, de dois em dois, tem início, enfim, o road movie, tipo de filme nos quais os personagens vivem sua trajetória de evolução diante dos olhos dos espectadores enquanto trafegam por uma estrada. E que trajetória de evolução, pontilhada de ironias!
O elenco é ótimo, com todos os atores muito bem dedicados aos seus papeis. A soma de roteiro bem elaborado, diálogos cuidadosamente construídos, personagens marcantes e atores entregues às suas interpretações resulta em um trabalho que tende a ser aplaudido por muitos outros 15 anos.