O otimismo pretende ser uma subversão em Tomorrowland – Terra do Amanhã, produção dos Estúdios Disney em cartaz nos cinemas de todo o país. Na contramão da onda de distopias adolescentes, que dão o tom sombrio às milionárias franquias de livros e filmes Jogos Vorazes e Divergente, o longa-metragem de Brad Bird (dos ótimos Os Incríveis e Missão: Impossível – Protocolo Fantasma), aposta no porvir como uma instância na qual o ser humano pode, caso faça a coisa certa, ter desenhado um mundo melhor, mais justo, humanista e ecologicamente balanceado.
Acontece que, no roteiro de Bird e Damon Lindelof (da série Lost), esse triunfo, apesar de ser uma possibilidade concreta, não é uma certeza. Um futuro próspero e equilibrado será o resultado de uma série de decisões, que devem ser tomadas hoje; caso contrário, a receita vai desandar. E aqui, além da destruição do planeta devido ao uso abusivo de seus recursos naturais e ao desrespeito ao meio ambiente, Bird traz a discussão a um plano mais individual, defendendo a tese de que a mesquinharia e a vaidade, traços negativos inerentes à natureza humana, estariam no cerne de toda e qualquer atitude destrutiva.

Em um primeiro momento, esse mundo utópico é visto da perspectiva de Frank Walker (Thomas Robinson), um garoto com ambições de inventor cuja primeira engenhoca, uma mochila com propulsores para voar mas que não decola, é alvo de deboche e desdém na Feira Mundial de 1964.
Decepcionado, o guri pensa em desistir de tudo, mas, cumprindo à risca o percurso traçado pela Jornada do Herói (de Joseph Campbell), ele conhece uma mentora em forma de menina: Athena (Raffey Cassidy), que o presenteia com um broche, espécie de passaporte para que entre no mundo paralelo de Tomorrowland. Lá, mentes inventivas como a dele são reconhecidas e ele poderá desenvolver seus sonhos sem medo do fracasso. É o chamado para um desafio.
O filme argumenta que esse temor da derrota, representada pelo cinismo imperante no mundo materialista, desprovido de ideais elevados, impede que a humanidade prospere.

O universo paralelo de Tomorrowland, resultante de atitudes bem calculadas, com sensatez e generosidade, segue à risca a cartilha bem comportada do universo Disney, moldado tal qual um parque temático, onde tudo, da arquitetura aos figurinos dos figurantes, parece um tanto artificial.
Décadas mais tarde, nos dias atuais, nos quais o planeta parece estar correndo sérios riscos de extinção, quem será presenteada com o mesmo button é a adolescente Casey (Britt Robertson), cujo idealismo lembra muito a ingenuidade de Frank e também sensibilizará Athena, para quem os anos não passaram: ela, misteriosamente, segue sendo a mesma menina que se aproximou de Frank. Por que será?
Filha de um engenheiro da Nasa (o cantor country Tim McGraw), prestes a perder o emprego, pois a plataforma de lançamento onde trabalha será desativada, Casey assume o papel de militante. A sua maneira, ela insiste em fazer ações de protestos para impedir o processo de desmonte.
Como Frank tinha no passado, Casey é identificada como uma otimista perfeita, desprovida de cinismo, capaz de se tornar uma Plus Ultra – esquadrão capaz de salvar Tomorrowland, ou seja, de salvaguardar o futuro do planeta.
Mas há uma pedra no caminho: Frank, que não é mais o garotinho cheio de esperanças do passado. Ele, agora na pele de George Clooney, se tornou um homem cético e amargo, que vive como um ermitão em uma casa cheia de aparatos que inventou, mas que para nada servem. Ele teria sido expulso de Tomorrowland por Nix, seu ambíguo governador, interpretado por Hugh Laurie, protagonista da série House.
O confronto entre o otimismo e o idealismo de Casey e a desilusão e cinismo de Frank são o ponto nevrálgico do filme de Brad Bird. E é justamente nessa tensão (ou falta dela) que reside a grande fragilidade da trama. O conflito, talvez por um falha do roteiro, excessivamente esquemático e sem uma maior complexidade, não convence muito.
Tomorrowland – Terra do Amanhã, na ânsia de não perder o ritmo, de encadear cenas de ação, possivelmente de olho no público mais jovem, menos interessado em questões mais filosóficas, é um tanto superficial. Prende-se demais à visão maniqueísta de bem e mal, certo e errado, esperança e cinismo. A narrativa é simplificadora demais e, embora o filme seja visualmente impressionante e por vezes encantador, fica no meio do caminho.
O universo paralelo de Tomorrowland – Terra do Amanhã, resultante de atitudes bem calculadas, com sensatez e generosidade, segue à risca a cartilha bem comportada do universo Disney, moldado tal qual um parque temático, onde tudo, da arquitetura aos figurinos dos figurantes, parece um tanto artificial. São simulacros que parecem, a todo instante, prestes a se desmontar como se fosse um grande e oneroso cenário. Apesar de encherem os olhos.
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