Uma boa pedida para quem tem filhos, pretende ter um dia ou convive com crianças é o filme Tallulah, disponível na Netflix. A trama envolve uma mãe alcoólatra que não se encontra no papel de mãe, uma jovem independente que mora em uma van, um bebê roubado, a ex-sogra: elas vivenciam dramas da maternidade, do cuidado com o outro que é imputado às mulheres e se recriam ao longo da história.
O filme deixa bem claro que mães são pessoas. Pessoas humanas. E como é normal da natureza humana, mães falham. Erram o tempo todo. Erram tentando acertar. Erram porque não são os seres angelicais e dotadas de paciência infinita como querem as músicas, a poesia, a literatura e a expressão “coração de mãe” (como se tudo coubesse lá, indiscriminadamente).
No filme, vemos uma mãe que precisa de tempo, espaço e apoio após ter a filha roubada por uma mulher que pouco cuida de si mesma e que nem imagina como é cuidar de outrem. No entanto, é o afeto que mostra o caminho. O afeto também é o que guia a suposta avó da criança que, embora estivesse desiludida com a vida, reaprende a gostar de si mesma e dos outros por meio do contato e do cuidado com a criança.
A história remete ao dilema sobre ser ou não ser mãe e, sendo mãe, como equilibrar o cuidado com os filhos e a própria personalidade.
O drama, exibido no festival de Sundance, no início do ano, é estrelado por Ellen Page e Allison Janey. Tallulah é um filme sensível, que trata de uma dicotomia relevante na vida materna. A história remete ao dilema sobre ser ou não ser mãe e, sendo mãe, como equilibrar o cuidado com os filhos e a própria personalidade. Temos vida própria depois de ter filhos? A maternidade tem de ser exercida o tempo todo? Podemos admitir fraqueza? Podemos admitir que há dias em que dá vontade de sair correndo, que precisamos de um tempo a sós com a gente mesmo? Podemos admitir que amamos os filhos, mas que há mulheres que se arrependem de ser mães? Podemos admitir que nem sempre temos maturidade e empatia suficientes para a função? Podemos admitir que é das melhores tarefas, mas a mais difícil?
Devíamos, pelo menos. O jeito mais saudável e honesto de lidar com um sentimento é admitir que ele existe. Embora com filhos a alma transborde de amor, por vezes não temos nada de bom para oferecer. E tudo bem: somos humanas, temos limites. É por isso que precisamos de uma rede de apoio: pai da criança, parentes, vizinhos, amigos. Seja para cuidar dos filhotes por um tempo ou para servir como companhia ou ombro amigo para uma conversa sincera. E as personagens de Tallulah, que não tem guarida, mostram esse e outros “dilemas sociais”: não é possível que uma mãe deixe a filha com uma desconhecida, que parece ser a babá, para ir a um encontro casual. E ainda: não é possível que uma jovem queira viver de aventuras em uma van em vez de “sossegar” com o namorado; não é possível que uma mulher abandonada continue vivendo triste e não dê “a volta por cima”. No fim, é a mulher e o papel de mãe que está colocado em xeque.
A trama não dá respostas, mas é um bom caminho para iniciar muitas perguntas sobre a pressão social sobre as mulheres e mães, sobre a cobrança (e a “autocobrança”) de perfeição no papel de mãe e sobre a necessidade de admitir que há falhas (somos humanas, lembra?); embora elas não sejam um problema, parecem pesar demais. Talvez aceitá-las, falar sobre elas e apoiá-las seja um caminho para a solução.