Saiu à francesa, como se costuma dizer. Sem despedidas. Levantou-se discretamente e dirigiu-se à porta o mais rápido que conseguiu. Tinha o firme propósito de não se fazer notar, fingindo-se de alguma forma invisível. Fato é que, com ou sem testemunhas, conseguiu o que desejava: ganhar a rua e sentir o ar frio da noite entrando em suas narinas. Respirou fundo e chegou a esboçar um sorriso ao pisar na calçada. Sentia-se livre ao caminhar pelas ruas quase vazias, ainda sem decidir aonde iria. E também um tanto aliviado.
De uns tempos para cá, ele vinha evitando passar tempo demais em lugares fechados, apinhados de gente. Vozes, quando se misturavam, lhe davam certa angústia, e ele ficava ansioso. Tinha dificuldade em prestar atenção ao que lhe diziam quando havia outros falando ao mesmo tempo. As frases se entrecortavam, fundiam-se, atropelavam-se para, por fim, perderem o sentido em seus ouvidos. Parecia que todos falavam sem nada dizer e o silêncio o chamava como um canto mudo de sereia.
Era uma fase, sabia. Não se cobrava por não querer socializar demais. Tinha se dado conta de que precisava não exatamente da solidão, mas de uma certa distância que lhe permitisse observar quem o cercava com olhos mais serenos, nem sempre atentos, mas interessados quando julgasse necessário, ou de fato quisesse.
Era uma fase, sabia. Não se cobrava por não querer socializar demais. Tinha se dado conta de que precisava não exatamente da solidão, mas de uma certa distância que lhe permitisse observar quem o cercava com olhos mais serenos, nem sempre atentos, mas interessados quando julgasse necessário, ou de fato quisesse. Precisava de redescobertas a seu tempo, sem pressa. Sociabilizar não deveria ser uma imposição, ele se dera conta. Essa constatação era libertadora, como aquele ar gelado de princípio de inverno que agora lhe acariciava as faces enrubescidas.
Não pensou em voltar. À medida em que se distanciava, lembrou de todos que ali estavam e com quem gostaria de conversar, um a um, sorvendo cada palavra, para não desperdiçar as suas próprias, que agora guardava em um lugar seguro. Como todo o cuidado, para quando estivesse pronto. Até lá, caminharia sem muito rumo, ouvindo a própria respiração. Estava vivo, enfim.