Sou notório por possuir, desde que me entendo por gente, um paladar seletivo e uma dieta restrita, porém não saudável. O famoso fresco. Embora as situações da vida adulta tenham me arremessado em direção a novas opções culinárias, passei boa parte da minha infância e adolescência com uma irrefreável aversão a vegetais em geral – que nem mesmo excluía a alface e o tomate de um inocente e deletério x-salada de trailer de comida – e uma necessidade vital por carne vermelha. A pedagogia infantil ainda não encontrou saídas para desfazer o mal causado na primeira idade, de modo que aos meus pais e simpatizantes de sua causa em prol da minha boa alimentação, nada mais restou além dos sermões aterrorizantes que tangenciavam, de maneira branda, a questão da minha morte prematura.
A narrativa, em linhas gerais, defendia a tese de que eu, em médio prazo, desenvolveria doenças causadas pelo tanto de x-burger, salgado de padaria, churrasco e pão com linguiça (até hoje, minha comida favorita) que eu comia. Não sei se alguém chegou a falar nesses termos, mas essa ladainha batendo na minha mente assustável de criança me causou a convicção indelével de que eu morreria, no mais tardar, até os 45 anos. Estaria eu, portanto, a menos de uma década e meia do prazo final, e a realidade é que, como resultado, não consigo me imaginar uma pessoa velha. Cabelo branco, careca, rosto enrugadinho, com dificuldade para me locomover, nada disso faz parte da minha projeção futura. E embora saiba que para qualquer um seja difícil se imaginar adulto, meu bloqueio, é bom que se diga, concerne apenas à terceira idade.
Cabelo branco, careca, rosto enrugadinho, com dificuldade para me locomover, nada disso faz parte da minha projeção futura. E embora saiba que para qualquer um seja difícil se imaginar adulto, meu bloqueio, é bom que se diga, concerne apenas à terceira idade.
Meu planejamento de vida é todo ele a médio prazo. Faço uma previdência privada sem pensar muito no assunto, e a reforma de Michel Temer talvez tenha pouco me comovido por essa razão. Gostaria de imaginar minha vida de aposentado, mas não consigo sair dos clichês observados nos meus avós, para quem a velhice se resume a grupos de oração, cuidar de passarinho, jogar baralho e almoçar terrivelmente cedo. É uma sensação estranha enxergar esse negrume no horizonte, e igual ao abismo de Nietzsche, quanto mais eu o encaro, mais ele me encara de volta.
A variedade de alimentos aumentou ao longo do ano, e hoje sou capaz de apreciar uma salada fresca e cogumelos salteados. Mas creio que já seja demasiado tarde para demover-me da ideia de não ver meus cinquenta anos.
Acho que a lição aqui é: não há como prever os traumas que a vida vai causar. Na dúvida, coma vegetais.