Alguns meses atrás, contei a história de Boris, meu anfitrião russo que diversas vezes disparou comentários constrangedores a respeito de judeus e gays – o que, de novo, sintetiza mais ou menos bem o pensamento geral do russo médio. Para ele, só interessa os russos que estão na Rússia, e a grande maioria das outras pessoas ou são “pobres turistas que não sabem onde estão se metendo” ou são “câncer no meu país”.
Pois bem, acredito que tenha vislumbrado uma pista para esse tipo de orgulho nacionalista combinado a doses elevadas de preconceito racial e social. Acontece que Boris jamais viajou para fora da Rússia, e considera a possibilidade “um pesadelo total”, por não ser capaz de se sentir no controle do ambiente. Ora, Boris é um grande admirador de cultura estrangeira. Gosta dos vídeos do Postmodern Jukebox, que faz versões jazzísticas de pop hits, aprecia frutas tropicais e tem um desejo caricaturalmente recalcado por mulheres de pele escura, ou mesmo caucasiana do “lugar errado”. Não seria por falta de interesse que Boris não viajaria para fora do país, mas, talvez, o medo de se sentir na pele do que despreza sem solenidade. Um câncer no país dos outros.
Viajar – viajar mesmo, o que inclui, de acordo com a minha filosofia de vida, entrar em contato com nativos do país, conversar com eles e conhecer suas opiniões a respeito do lugar onde você está – é algo que liberta de muitos preconceitos.
Faça uma lista de todos as pessoas preconceituosas que você conhece. É bem possível que a grande maioria delas nunca tenha saído do Brasil. É bem possível ainda que, das que viajam para o exterior, a maioria vá para os Estados Unidos, França, Reino Unido, lugares que conferem status a quem está nele e raramente obrigam o visitante a conviver com locais. Você pode até mesmo, se tiver vontade de se aventurar, pegar um avião e, depois de algumas escalas, parar no Vietnã, ficar em um hotel luxuoso e só sair de lá com grupos ou guias que vão fazer você se sentir seguro e olhar para todos os habitantes daquele país como aproveitadores safados que só querem saber de se aproveitar de você. Mas o fato é que poucos passaportes válidos em um país é mais ou menos equivalente a uma alta taxa de xenofobia e outras fobias em geral.
Viajar – viajar mesmo, o que inclui, de acordo com a minha filosofia de vida, entrar em contato com nativos do país, conversar com eles e conhecer suas opiniões a respeito do lugar onde você está – é algo que liberta de muitos preconceitos. Você pode voltar com mais preconceitos também, é claro, mas não se preocupe. A chance de deixar de encarar o outro como um conflito e passar a encará-lo como parte da experiência humana vai ser sempre maior.