Poucos assuntos foram mais comentados na semana passada do que o fim do programa Vídeo Show, uma das mais antigas atrações da grade da Globo, que definhou por uns bons anos e morreu, quase sem aviso, na última sexta-feira (dia 11). Para desgosto – ainda que não tenha sido exatamente uma surpresa – de quase todo mundo, o Vídeo Show se foi de forma frustrante, sem uma grande despedida que fizesse jus aos 35 anos do programa.
A notícia do encerramento do Vídeo Show chamou muita atenção, ao que me parece, pela ligação emocional que boa parte dos espectadores teve, durante anos, com a atração. Na infância, lembro que o programa era, literalmente, um dos momentos mais esperados do sábado, e configurava como uma grande celebração da própria televisão, nos possibilitando “espiar” os bastidores da gigantesca “Vênus Platinada” – fazendo-nos, por tabela, sentir parte deste “Olimpo” midiático. Não por acaso, o quadro mais esperado era o “Falha Nossa”, que veiculava erros de gravação nas novelas e demais programas.
Com o fim do programa, que já beirava sua quarta década, surgiram uma série de análises – em grande parte, muito interessantes – que visava responder à pergunta: por que o Vídeo Show se esgotou e não conseguiu sobreviver, por mais que a Globo tenha investido continuamente em tentativas para a sua permanência? Muitas razões foram listadas: a incapacidade de achar apresentadores competentes e carismáticos, como outrora foram Miguel Falabella, Cissa Guimarães e André Marques – e, mais recentemente, Monica Iozzi e Otaviano Costa; a concorrência desleal com internet, já que muito que nos atraía no Vídeo Show eram os registros históricos da TV, que agora estão disponibilizados no YouTube, ao alcance de um clique; o “jornalismo” chapa-branca feito por um programa desses, configurando quase como um colunismo social das estrelas da Globo (afastando-se, por consequência, da própria essência do jornalismo de celebridade, baseado na maledicência, na espiada maldosa na vida do outro).
São todos argumentos legítimos, que ajudam a explicar a ascensão (que tem a ver com a centralidade da televisão na vida das pessoas) e queda (o inevitável fatiamento desta audiência televisiva com outras plataformas) do Vídeo Show. O argumento do jornalismo chapa-branca, por exemplo, é totalmente plausível: basta ser sincero para assumir que há muito mais graça nas especulações e na acidez de programas como Fofocalizando (SBT) e A casa é sua (RedeTV!) do que na puxação de saco à própria Globo (justamente ela, tão amada, zoada e odiada quase na mesma medida). Neste sentido, diria que o Tá no Ar, que volta em breve para sua última temporada, tem um papel mais importante à autocrítica do que o próprio Vídeo Show.
Sugiro que o fim do Vídeo Show suscite a reflexão sobre a dificuldade que a televisão tem enfrentado para conseguir se renovar. É quase como se tudo que fosse possível fazer em TV já tivesse sido pensado antes.
Para ilustrar esse argumento (do quanto o “peleguismo” do programa conspirou para a sua decadência), é preciso lembrar dos últimos quadros novos levados ao ar. Um deles, um quadro em que o ator/ repórter Felipe Titto preparava um prato numa cozinha cenográfica com algum contratado da Globo (geralmente, um semi-conhecido do grande público), meio à la Ana Maria Braga. Outro quadro era um tricô sem graça entre o apresentador e produtor de moda Matheus Mazzafera, visava simples e claramente apenas expor a intimidade do entrevistador com pessoas famosas. Digamos que é muito mais fácil para nós, pobres mortais, sentirmo-nos próximos de Léo Dias, em suas falhas (só para pontuar, Léo, num Fofocalizando muito comovente, se despediu para se internar numa clínica para se livrar do vício em cocaína), do que da vida hi-society e repleta de grifes e plásticas de Matheus.
Mais do que isso, sugiro que o fim do Vídeo Show suscite a reflexão sobre a dificuldade que a televisão (especificamente a Globo, mas não apenas ela) tem enfrentado para conseguir se renovar. É quase como se tudo que fosse possível fazer em TV já tivesse sido pensado antes. A falta de criatividade quanto a bons novos formatos é evidente quando vemos nas propostas confusas de programas como Os Melhores Anos de Nossas Vidas (espécie de game show sem sentido em que “artistas” competem representando diferentes décadas), Só Toca Pop (uma tentativa frustrada de recuperar programas de parada de sucesso, como Globo de Ouro, em pleno 2018) e Tamanho Família (competição forçada entre famílias de famosos e comandado por um apresentador que não cativa). Não por acaso, os programas de maior audiência, como Big Brother Brasil, já possuem grande longevidade na grade. No SBT, Silvio Santos explora há décadas os mesmos quadros e mesmas atrações, apostando no certo e evitando riscos. E vale lembrar que todos os programas novos de bastante sucesso – como MasterChef e Bake Off Brasil – são franquias compradas de outras emissoras.
Era esperado que o encerramento de um programa tão importante para a emissora tivesse ocorrido de forma menos improvisada, e que retomasse, com mais dignidade, a própria história desta enciclopédia televisiva. Mas, por fim, fica a provocação: é um milagre pensarmos que um programa que tem “vídeo” no nome tenha durado quase quarenta anos.