Espero que 2019 seja o início de uma nova tendência: séries dramáticas com menos de meia hora. Sem enrolação, sem cenas desnecessárias, sem cansaço. Assim é Homecoming, série exclusiva da Amazon Prime, criada e dirigida por Sam Esmail (o mesmo de Mr. Robot) e baseada em um podcast de sucesso.
Estrelada por Julia Roberts, a série começa acompanhando Heidi Bergman (Roberts), assistente social da Homecoming, uma instalação liderada por uma instituição chamada Geist Group, que ajuda soldados na transição para a vida civil depois de terem lutado na guerra. Mas alguma coisa acontece nesse tratamento. Anos depois, a Homecoming não existe mais e Heidi trabalha como garçonete. Um auditor do Departamento de Defesa (Shea Whigham) a questiona sobre o motivo dela ter deixado a instituição. Heidi, porém, não lembra de nada. O que aconteceu? Por que ninguém fala nada?
Com dez episódios, a série não tem grandes cenas de ação e nem um grande mistério, mas tudo é… esquisito. Sam Esmail e seus roteiristas mostram um talento ao criar tensão apenas com diálogos. Basicamente, os personagens conversam e tudo é muito peculiar. Heidi parece acreditar no seu trabalho em ajudar aqueles jovens soldados, mas seu chefe, Colin (Bobby Cannavale), está sempre muito tenso e preocupado com os efeitos de um tal medicamento que os soldados precisam tomar todos os dias. Efeitos colaterais começam a aparecer e Heidi se afeiçoa por um paciente, Walter (Stephan James), que visivelmente carrega alguns traumas vividos na guerra, mas que pouco a pouco sente que está esquecendo algumas coisas.

Homecoming é uma experiência visual diferente de tudo o que vemos atualmente na TV.
Cheio de flashbacks, Homecoming é uma experiência visual diferente de tudo o que vemos atualmente na TV. Tal como fez em Mr. Robot, porém com mais inteligência, a câmera de Sam Esmail é um outro personagem que ajuda a compor a história. Com planos-sequência e enquadramentos simétricos que deixam o público tenso, a série é montada e editada para dar um ritmo invejável a qualquer história de ação (mesmo sem um tiro sequer). Homecoming quebra todos os padrões, com imagens borradas, tela quadrada com barras laterais (que dão uma sensação de aperto horrível), trilha sonora interrompida em momentos nada óbvios e detalhes que acontecem fora do enquadramento e que são essenciais para a história.
Julia Roberts entrega uma performance que há tempos não víamos. Arrisco a dizer que está tão boa quanto esteve no longa Closer – Perto Demais (2004) e no filme feito para a HBO, The Normal Heart (2014). Despida de qualquer vaidade, a atriz assina a produção executiva da série e, talvez por isso, compreende a confusão mental de sua personagem desde o primeiro momento. Sorri pouco (e quando sorri, não soa verdadeiro) e vai se deteriorando conforme sua personagem vai compreendendo a rede de conspiração em que se meteu.
Com claras inspirações nos filmes de Hitchcock, Homecoming é um quebra-cabeças engenhoso. Vamos montando as peças junto com os personagens enquanto acompanhamos imagens estilistas que ajudam a aumentar nossa angústia. O desfecho dá quase todas as respostas mais superficiais, que confirmam o que a gente achava que era no começo, mas espectador acaba com muito mais dúvidas. A impressão é de que o buraco é mais embaixo. Já renovada, Homecoming é um respiro de genialidade e a prova de que a Amazon avança a passos largos em produções de séries acima da média.