Pediu um minuto para a mulher que estava na sua frente, pegou o telefone, olhou o número na tela do computador e discou. Um homem atendeu.
– Oi, bom dia. Por favor, o Romeu Garcia.
– Sou eu mesmo.
– Oi, Romeu! Aqui é a Talita, sou chefe do Departamento de RH das Casas Maria, tudo bem?
– Tudo bem, sim, e com você?
– Tudo bem.
Fez um sinal de “só mais um minutinho” para a mulher, que parecia impaciente, e voltou ao telefone.
– Romeu, o motivo do meu contato é que você fez uma entrevista aqui com a gente.
– A senhora deve ter ligado errado, Talita, não fiz nenhuma entrevista recentemente.
– Isso mesmo, foi em 1997. Eu estou ligando para avisar que infelizmente você não foi selecionado no nosso processo, mas que desejamos muito sucesso.
– Olha, disso eu já sabia.
– Sabia?
– Faz 20 anos que fiz a entrevista aí e 15 que estou no meu emprego atual, então acho que sabia.
– Ah, sim, com certeza sabia! Mas é que eu achei importante dar esse feedback.
A mulher se levantou. Talita pediu para que ela esperasse só mais um pouco. Sentou novamente.
– Romeu, eu vou ser bem breve aqui porque tem alguém me esperando. Mas só pra explicar: eu fiz um retiro espiritual e tô tentando ser melhor.
– Romeu, o motivo do meu contato é que você fez uma entrevista aqui com a gente.
– A senhora deve ter ligado errado, Talita, não fiz nenhuma entrevista recentemente.
– Isso mesmo, foi em 1997.
– Humm…
– E eu saí de lá pensando: eu não quero ser essa pessoa que fala “a gente entra em contato” e não entra em contato. E eu fui ela desde o começo da minha carreira, Romeu!
– Entendi. Tudo bem, da minha parte, tá perdoada.
– Você não faz ideia do quanto isso significa pra mim. Você gostaria de saber por que não passou?
– Faz muito tempo, eu realmente não me importo. Mas se quiser falar, tudo bem.
– É que às vezes é bom para os seus próximos empregos, né? Você não foi selecionado porque não soube responder quem levar para uma ilha deserta em três segundos, e a gente realmente acreditava naquela época que era essencial ter escolhido a Xuxa ao invés da Angélica, por questões internas da empresa.
– Certo.
– Eu estou ligando para todas as pessoas que não tiveram retorno, você foi a quinta de hoje. Tô tendo que encaixar essas ligações no meio das minhas atividades do dia a dia, não está sendo fácil.
– Imagino.
A mulher se levantou e gritou “Isso é um desrespeito, eu vou embora! Foda-se!”.
– Romeu, preciso desligar porque tem uma entrevistada gritando comigo aqui. Foi um prazer.
Desligou.
– Mas isso é jeito de se comportar durante uma entrevista, Jackeline? Pode ir embora se quiser. Me desculpa por querer ser uma pessoa melhor.
A mulher caminhou até a porta, pisando forte no chão.
– Pode deixar a porta aberta. A gente entra em contato.