O homem se aproximou do primeiro da fila na parada de ônibus e pediu dinheiro para comprar um pouco de pão. Disse que se fosse necessário comeria o pão na sua frente, só pra provar que não pretendia comprar drogas. Mas o primeiro da fila já não ouvia mais nada: virou o rosto tão logo se falou em dinheiro. O homem se aproximou então do segundo da fila, que calhou ser eu mesmo. Dei a tradicional resposta que não tinha trocado comigo, o que era verdade. Sua reação foi um educado agradecimento. A garota atrás de mim se saiu ainda melhor, porque acrescentou um comovido “se eu tivesse algo, com certeza ajudaria”. E o homem novamente agradeceu.
Na sequência da fila estava uma mulher que o Nelson Rodrigues chamaria de gorda e patusca como uma viúva machadiana. Ela nem ao menos se dignava a olhar para o homem à sua frente. Este, reparou então na sacola que a mulher carregava, o que deu início a um animado diálogo:
– Olha só! Você tem pão aí dentro!
– Tenho sim! É pros meus filhos! Vá trabalhar que você vai ter também.
Reparou então na sacola que a mulher carregava, o que deu início a um animado diálogo:
– Olha só! Você tem pão aí dentro!
– Tenho sim! É pros meus filhos! Vá trabalhar que você vai ter também.
– A senhora um dia vai precisar pedir que nem eu. Te rogo uma praga!
– Pois rogue que ela volta pra você.
– Então já voltou, e eu te mando de novo!
E continuaram nessa discussão por algum tempo, até o homem se afastar.
A viúva machadiana virou-se então para nós e começou a se queixar de tamanho atrevimento. Buscava o nosso apoio, mas eu nem ao menos me dignava a olhar para a mulher à minha frente.
Logo em seguida apareceu uma senhora vendendo doces e a mulher aproveitou a deixa: “Ele devia fazer como a senhora”.
E como àquela hora sua fome era insuportável, abriu a carteira e comprou alguns doces. A garota atrás de mim, aquela que só não havia ajudado porque não tinha dinheiro, virou-se para a vendedora e falou: “E pra mim me vê dois desses”.
Era um dia de sol, e a garota ainda me perguntou as horas. Faltavam três minutos para as quatro, e nós tínhamos um grande problema na nossa vida, porque aquele ônibus não chegava nunca.