No livro Corpo, lançado em 1984 por Carlos Drummond de Andrade, há um poema que eu desconhecia até semana passada. Intitula-se “Como Encarar a Morte”. Eu o descobri aleatoriamente ao folhear o volume, que encontrei em um sebo de Curitiba, o Raridades, onde nunca havia posto os pés.
A poesia chamou a minha atenção por conta do título. Nunca pensei tanto sobre a morte quanto neste ano. As histórias que chegam até mim, seja pelos meios de comunicação, ou pelas redes sociais, são tantas, que me pego em estado permanente de luto, de sobressalto: quem será o próximo?
O texto de Drummond é dividido em cinco partes, cada uma com um subtítulo relacionado a como se percebe, ou se encara, a morte: “De longe”, “A meia distância”, “De lado”, “De dentro”, “Sem vista”.
Nas últimas semanas, soube da morte de cinco pessoas, de quem eu não era íntimo, mas que conhecia mais ou menos de perto. Foram muito choradas, sentidas, e como ocorreram em questão de algumas semanas, acabaram por me lançar em um rio de tristeza, de pesar.
Nunca pensei tanto sobre a morte quanto neste ano. As histórias que chegam até mim, seja pelos meios de comunicação, ou pelas redes sociais, são tantas, que me pego em estado permanente de luto, de sobressalto: quem será o próximo?
A primeira foi uma ex-colega de faculdade de Jornalismo, Carmen Barcelos, sobre quem já escrevi aqui. Perdeu uma luta de anos contra um câncer, que por fim a venceu. Depois partiu, vítima da Covid-19. Marcos, amigo de meu pai, que adorava cantar em karaokês. Por isso, recebeu de meu velho, que chorou muito a sua perda, o apelido de Sinatra.
A Covid também já havia levado, em abril último, sem que eu tivesse ficado sabendo, o jornalista carioca Aloy Jupiara, amigo de toda uma vida de uma querida amiga minha de infância, Isabella. Eu o conhecia pouco, de alguns encontros no Rio de Janeiro, mas o admirava à distância. Senti muito por ele e por minha amiga.
Semana passada foi embora, de repente, para espanto de todos os que o conheciam, e amavam, o designer Paulo Peruzzo, pessoa de mil talentos, inquieta e perspicaz, que conheci nos anos 1980 e acompanhava a certa distância desde então. Sucumbiu a um câncer descoberto há pouco.
Por fim, na última sexta-feira, Cristiane Zem, mãe de Gabrielly, uma ex-aluna minha de Jornalismo na PUCPR, foi morta com um tiro fatal, após uma tentativa de assalto em plena luz do dia, dentro de sua caminhonete, em São José dos Pinhais. Sem ter reagido ou a menor possibilidade de defesa. Em questão de segundos. Uma tragédia. Mais uma.
São muitas perdas, os lutos, em tão pouco tempo. Numa das estrofes do poema de Drummond, ao qual dá o subtítulo “De lado”, o poeta escreve sobre ela, a morte:
“Sente-se já, não a figura,
Passos na areia, pés incertos,
Avançando e deixando ver
um certo código de sandálias”
É um pouco isso que estou a sentir neste tempo em que vivemos em perigo. Como se fosse um espectro que nos ronda, ela está aqui, entre nós.