O evento que mobiliza o universo da arte em Curitiba chega aos 24 anos de história com uma programação extensa, que engloba mais de cem locais diferentes pela cidade. A autora que vos escreve, portanto, vem dedicando algumas colunas para que você não fique perdido e tenha a oportunidade de conhecer todas as obras incríveis presentes em Curitiba.
Não sabe por onde começar? Não sabe quais os espaços culturais participantes da Bienal de Curitiba ou quem são os grandes artistas expondo? Já falamos do Solar do Barão, do MuMa e, claro, das exposições no Museu Oscar Niemeyer. Hoje, no entanto, saímos do circuito clássico: vamos falar de galerias de arte.
Há quem acredite, tomado em grande parte pela insegurança, que galerias podem ser um tanto inacessíveis, por vezes opressoras. Esse estereótipo foi alimentado ao longo dos anos e, em momentos atuais, tem se tornado cada vez mais caricato. Felizmente, a Bienal está aqui justamente para te ajudar a quebrar essa barreira: são diversas galerias inseridas dentro do circuito oficial do evento. Suas portas são abertas ao público – gratuitamente! – e o convite é claro.
Apoiar galerias significa apoiar tudo o que é mais efervescente no mundo da arte e, principalmente, na cena local. Esse nicho tende a seguir mais de perto as tendências da cidade, do público e a dar suporte a artistas de potencial – ou seja, é aqui que aparecem primeiro as joias. Vamos a algumas:
SIM Galeria
A SIM Galeria já têm importância e história consolidadas na cidade. Nascida em 2011, assina exposições de arte contemporânea proeminentes, com artistas conhecidos em âmbito nacional e internacional. Aqui, o ritmo de mostras individuais e coletivas é constante: sob direção de Guilherme e Laura Simões de Assis, a galeria é situada numa charmosa casa de pedra, com os devidos ajustes contemporâneos, no coração da vida boêmia curitibana, bem próxima à Vicente Machado. O espaço por si só já valeria a visita e, para os leigos em galerias, é um ótimo lugar por onde começar.
Esse nicho tende a seguir mais de perto as tendências da cidade, do público e a dar suporte a artistas de potencial.
Mas muito bem: o que encontrei por lá? Inserida consecutivamente no circuito oficial da Bienal, a SIM apresenta atualmente as exposições Arte Cinética Latino-Americana e Plano Inclinado, de Marcelo Moscheta.
Na primeira, encontramos produções contemporâneas de Brasil, Argentina e Venezuela, que remetem ao movimento artístico francês da década de 1950, que buscava a ilusão óptica, a sensação de movimento e luz e, principalmente, a ruptura da ideia de que obras de arte são apenas estáticas (em outras palavras, imóveis por si só).
A exposição, que segue até o dia 16 de dezembro, traz uma aproximação contemporânea entre arte e ciência consistente e interessante, com nomes de peso como Abraham Palatnik, Antonio Maluf e Ubi Bava.
No entanto, o destaque ficou para Plano Inclinado, mostra individual de Marcelo Moscheta, que brinca com as noções de espaço físico, geográfico e, principalmente, com o que consideramos uma escultura. Ao lapidar pedras litográficas de modo a configurarem seu conceitos e instalações, Moscheta nos mostra essa faceta pós-moderna de escultura e um senso estético primoroso, unindo diversos materiais que não casariam tão facilmente assim.
A exposição, que tem curadoria de Marta Mestre, infelizmente terminou cedo demais – ontem, 11 de novembro. Mas nos traz a certeza de ficar de olho no trabalho de Marcelo Moscheta e, claro, na próxima mostra promovida pela SIM.
Boiler Galeria
A Boiler é uma galeria de arte contemporânea que chama a atenção não apenas por seu espaço, mas principalmente pela consistência do trabalho de seus artistas residentes e das mostras que abriga, com um apelo essencialmente local. Aqui está o perfeito exemplo de uma galeria que vem apoiando tudo o que é mais efervescente na arte contemporânea da região.
Neste pacote incluímos, por exemplo, artistas como Cintia Ribas e Felipe Scandelari, que estavam presentes na famigerada Queermuseu, além de outros fortes nomes locais como Adriana Tabalipa e Janete Anderman.
Sua sede é bem próxima à SIM – veja só, em uma tarde você pode matar dois coelhos com uma cajadada só -, em uma área caracterizada pelo engajamento cultural. Lá, podemos encontrar a última semana de exibição de Origami Curvo, exposição composta apenas por mulheres, reunidas por um enunciado em comum: o corpo.
A curadoria (Isadora Mattioli) explica que o título da mostra evoca a artista Iole de Freitas (Belo Horizonte, 1945), que descrevia seu trabalho escultório como “dobraduras curvas”. O conceito de corpo é revisitado por essas mulheres na busca de construir novas maneiras de estar presente fisicamente no mundo.
Por meio de pinturas, performances, vídeos e instalações, como de costume a Boiler traz uma exposição modesta em tamanho – são 16 artistas participantes -, porém grande em qualidade e coesão.
Destaque para a performance e instalação de Erica Storer, Exercício de auto sabotagem, que traz uma metáfora bem sensível ao tentar, durante três horas, fazer um buraco em uma pedra com uma colher; e a vídeo-arte de Lívia Fontana, responsável pela Boiler, que evoca ironicamente a dita santidade do corpo feminino. A mostra está em seus últimos dias – segue até dia 18 de novembro. A hora de conhecer a Boiler é agora.
Galeria Ponto de Fuga
A Galeria Ponto de Fuga surgiu tímida em 2012, no subsolo do boêmio Fidel Bar, no bairro São Francisco. Durante 2015 e 2016, seus idealizadores investiram em pesquisas e referências para que, em 2017, pudessem ressurgir ainda mais consolidados.
A galeria encontrou um novo espaço este ano e vem se moldando cada vez mais, fazendo jus à palavra. Inclusive, aos desavisados, dou a dica: nos fundos da Ponto de Fuga, ainda encontramos um bar secreto, inspirado na época da proibição do álcool nos Estados Unidos da década de 1920.
Para entrar no Ginger Bar, você precisa de senha (para descobrir, é só perguntar para a equipe nas redes sociais), e claro, passar pela galeria.
Atualmente, a Ponto de Fuga exibe a mostra Assuntos Brutos, de autoria curitibana do Coletivo Brutas. A exposição evoca a “materialização de uma conversa”, de diálogos e discussões em meio ao contexto político-cultural em que vivemos.
As obras trazem uma reflexão muito interessante sobre a polarização da sociedade brasileira entre esquerda e direita e a crença entre o bem e o mal. Como dialogar quando todos estão convictos da verdade?
Assuntos Brutos traz uma arte inteligente e necessária visto seu viés essencialmente político; segundo a curadora Milena Costa, as Brutas vêm na contramão dos tempos de monólogos e prosas corriqueiras, convidando para uma reflexão.
A Galeria Ponto de Fuga funciona a partir das 16h00, e segue aberta até o horário de funcionamento de seu bar secreto, 01h00. Assuntos Brutos vai até dia 2 de dezembro, e a programação geral da Bienal Internacional de Curitiba até 25 de fevereiro – mas não é desculpa para você deixar para ir na última hora, certo?
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