Para Lucy Schwob, renomear-se Claude Cahun não foi uma escolha impensada – era e ainda é um dos poucos nomes franceses que se adequa a ambos gêneros, masculino e feminino. No começo do século XX, mesmo com o movimento surrealista efervescendo no mundo da arte, a sociedade francesa era rígida quanto aos papéis e deveres distintos de homens e mulheres.
Ainda assim, Claude Cahun, lésbica assumida e nascida em uma família bastante abastada, não conteve seus ímpetos artísticos, criando obras intrinsecamente ligadas à androginia e à militância social.
Não se falava ainda sobre gênero fluido, ou o fato de uma pessoa poder se identificar como não-binária – em outras palavras, sentir-se homem e mulher e poder, ao mesmo tempo, também sentir-se nenhum dos dois. Pode parecer um conceito complexo para alguns, mas Claude era muito bem resolvida e ciente da importância da quebra de certos padrões.
Além de assumir a androginia como carro-chefe de seu trabalho artístico em uma época tão conturbada, participou também da resistência francesa contra o avanço nazista. Apesar de nascida em berço de ouro, foi uma mulher forte e preocupada com causas políticas e sociais.
É, também, uma das precursoras na modernidade a apresentar-se publicamente como alguém sem gênero. Então, por que Claude foi tão esquecida pela história e tão ocultada do movimento artístico francês?
Com um trabalho potente, além de escritora, Claude concentrou parte de seu tempo aprimorando-se na técnica do autorretrato.
Com um trabalho potente, além de escritora, Claude concentrou parte de seu tempo aprimorando-se na técnica do autorretrato.
Suas obras não são, no entanto, meramente estéticas: dialogam justamente com sua não-binariedade, com a multiplicidade de identidades dentro de uma pessoa só.
Por vezes obscura, por vezes irônica, o conjunto da obra de Claude chegou a ser redescoberto com a expansão do movimento queer nos anos 80 e 90, e serviu de influência até para David Bowie – em suas palavras: “She was really quite mad, in the nicest way possible”. Porém, não tardou muito para voltar ao esquecimento.
A neutralidade em relação a gênero flui por todo o seu trabalho; seu rosto, como uma tela, se transforma no que ela deseja – seja através da tinta, do figurino, da maquiagem.
Em todas as fotos, com roupas e adereços masculinos ou femininos, Cahun sempre parece, paradoxalmente, ela mesma. Sobre seu trabalho, Cahun escreveu: “Debaixo desta máscara, outra máscara. Eu nunca terminarei de remover todos esses rostos”.
Segue abaixo para maior conhecimento do conjunto de sua obra:
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